24/02/2023 às 13h56min - Atualizada em 24/02/2023 às 13h56min

A coisa julgada em matéria tributária e a discussão relativa à invalidação de seus efeitos

Luis Alberto Corecha Monteiro

Luis Alberto Corecha Monteiro

QUALIFICAÇÃO: Advogado Tributarista na Mendes Advocacia e Consultoria.

Luis Alberto Corecha Monteiro

O conceito de coisa julgada está inserido no artigo 502 do Código de Processo Civil, preceituando que o termo diz respeito a uma autoridade que impede a modificação ou discussão de decisão de mérito da qual não caiba mais recurso.

Em se tratando de matéria tributária, a sua definição em nada difere da acepção geral delineada pelo direito processual, a adição do adjetivo “tributária” ocorre em razão do objeto por ela almejada, qual seja o direito material tributário, proveniente de um processo judicial tributário.

A diferenciação quanto ao instituto aplicado ao direito tributário não intenta a criação de um sistema processual paralelo, mas objetiva reforçar a ideia de que o direito processual admite e adquire singularidades em virtude da natureza do conflito para o qual ele presta seus procedimentos e regras
Em verdade, em matéria tributária, a problemática não está propriamente na dúvida relacionada a existência ou não da coisa julgada nas sentenças de mérito que resolvem a lide entre Estado e contribuinte, mas justamente em compreender a abrangência dessa coisa julgada, considerando precipuamente o elemento temporal e a superveniência de alterações legislativas e, sobretudo, jurisprudenciais.

Nesse sentido, os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), decidiram, no dia 08.02.2023, que uma decisão definitiva, transitada em julgado, que verse sobre tributos recolhidos de forma continuada, ou seja, aqueles cuja cobrança se renova periodicamente, perderá imediatamente a sua eficácia, caso sobrevenha decisão da Corte em sentido contrário.

A análise do STF era bastante aguardada por conta do consequente impacto do julgamento na segurança jurídica e na forma de atuação do Fisco. Afinal, os ministros decidiriam a possibilidade da autuação de um contribuinte que já obteve decisão judicial favorável permitindo o não pagamento de um tributo mesmo que, posteriormente, ocorra mudança na jurisprudência.

Importante mencionar que desde 2011 o Superior Tribunal de Justiça (STJ) consolidou entendimento sobre o assunto, fixando, sob a sistemática de recurso repetitivo, o Tema 340, definindo que “o fato de o Supremo Tribunal Federal posteriormente manifestar-se em sentido oposto à decisão judicial transitada em julgado em nada pode alterar a relação jurídica estabilizada pela coisa julgada, sob pena de negar validade ao próprio controle difuso de constitucionalidade”.

No julgamento, entretanto, à unanimidade, os ministros votaram pela perda dos efeitos da coisa julgada em decisões sobre tributos recolhidos de forma continuada nos casos em que a Corte se manifestar em sentido antagônico, pois, segundo a tese vencedora, uma decisão, ainda que transitada em julgado, produz os seus efeitos enquanto perdurar o quadro fático e jurídico que a justificou, e ocorrendo alteração, os efeitos da decisão anterior podem deixar de se produzir.

Com relação a produção dos efeitos da nova decisão que mudou o posicionamento da Corte, ficou assentado que quando julgada em sede de julgamento de ação direta de constitucionalidade ou de recurso extraordinário com repercussão geral, esta começará a produzir efeitos de maneira automática a partir da publicação da ata do respectivo julgamento, sem a necessidade do ingresso de ação revisional ou rescisória pelo ente tributante e sem a possibilidade da modulação de seus efeitos.

E, nesse sentido, relevante mencionar que, diferentemente da unanimidade acerca da perda de eficácia de decisão contrária ao novo entendimento da Corte, houveram divergências na Turma com relação à modulação dos efeitos. Pleiteou-se que a decisão do STF produzisse efeitos apenas a partir da publicação da ata de julgamento de mérito dos recursos, ou seja, a União poderia cobrar tributos somente a partir de 2023. No entanto, em apertada votação, a Corte Constitucional, por 6x5, decidiu que a cobrança poderá ser retroativa.

Ademais, o colegiado destacou que a mudança de entendimento se assemelha à criação de um novo tributo e, por isso, deve observar os princípios da irretroatividade, da anterioridade anual e a noventena ou, no caso das contribuições para a seguridade social, a anterioridade de 90 dias. O julgamento foi teve os recursos extraordinários RE 55227 (Tema 885) e RE 949297 (Tema 881) como objetos centrais da discussão, resultando na fixação da seguinte tese:

I - As decisões do STF em controle incidental de constitucionalidade, anteriores à instituição do regime de repercussão geral, não impactam automaticamente a coisa julgada que se tenha formado, mesmo nas relações jurídicas tributárias de trato sucessivo.

II - Já as decisões proferidas em ação direta ou em sede de repercussão geral interrompem automaticamente os efeitos temporais das decisões transitadas em julgado nas referidas relações, respeitadas a irretroatividade, a anterioridade anual e a noventena ou a anterioridade nonagesimal, conforme a natureza do tributo.

Nos casos mencionados, a discussão central se pautou no direito ou não de recolher a Contribuição Social Sobre o Lucro Líquido (CSLL), no qual diversas empresas obtiveram assegurado direito na justiça nos anos 1990. Todavia, posteriormente, no ano de 2007, o STF considerou a cobrança do tributo constitucional. Assim, desde o referido imbróglio, discutia-se na Suprema Corte se o posterior julgamento declarando a constitucionalidade do tributo teria o condão de invalidar as decisões anteriores que concederam o direito ao não recolhimento.

            Por fim, ainda que o Supremo Tribunal Federal tenha decidido pela não modulação dos efeitos, os contribuintes estudam a possibilidade de contestar judicialmente o tema por meio de Embargos de Declaração.

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