03/01/2023 às 14h52min - Atualizada em 03/01/2023 às 14h52min
Projeto de Lei 2896/2022 e suas infelizes alterações à lei das estatais brasileiras
Marcella Blok
A alteração do artigo 17, parágrafo 2º, I e II vai de encontro aos preceitos da OCDE e carece de constitucionalidade pela forma em que o procedimento legislativo foi realizado
Outrora elogiosa e elogiável a Lei 13.303/2016- a Lei das Estatais- vem sendo alvo de infeliz tentativa de alteração de seu parágrafo 2º do artigo 17 por meio do Projeto de Lei 2896/2022 com fins escusos de beneficiar, de forma ilícita, alguns indivíduos que não possuem expertise alguma para presidir, gerenciar e liderar as estatais mais importantes de nosso país (tais como a Petrobras, o BNDES, a Caixa Econômica Federal e outras).
Tal Projeto de Lei busca alterar a vedação (ou seja, permite) a indicação, para o Conselho de Administração e para a diretoria das empresas estatais “de representante do órgão regulador ao qual a empresa pública ou a sociedade de economia mista está sujeita, de Ministro de Estado, de Secretário de Estado, de Secretário Municipal, de titular de cargo, sem vínculo permanente com o serviço público, de natureza especial ou de direção e assessoramento superior na administração pública, de dirigente estatutário de partido político” e “de pessoa que atuou, nos últimos 36 meses, como participante de estrutura decisória de partido político ou em trabalho vinculado a organização, estruturação e realização de campanha eleitoral”
Não raras vezes, nossos legisladores e membros de outros poderes padecem de razoabilidade e de bom senso. Infelizmente, é este, novamente, o caso. Nas palavras da prestigiada Elise Brites, “o conteúdo modificado pelo projeto de lei irá produzir o risco de ruptura e continuidade de práticas de gestão internacionalmente reconhecidas, criando um ambiente de fragilidades em ciclo de credibilidade e compromissos assumidos, o que colocará em dúvida a forma com que os resultados futuros serão conquistados”.
Na mesma trilha, posicionam-se o IBGC, a Transparência Internacional Brasil, a Amcham (Câmara Americana de Comércio para o Brasil), o Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social, o INAC – Instituto Não Aceito Corrupção, dentre outras entidades, repudiando veemente a alteração do procedimento legislativo adotado para alterar os referidos requisitos e vedações estabelecidos pelo artigo 17 da Lei 13.303/2016 e o artigo 8- A da Lei 9.986 para a investidura dos cargos de administradores das empresas estatais e diretores das agências reguladoras salientando que “os danos decorrentes de indevidas interferências político-partidárias prejudicam os cofres públicos e a qualidade dos serviços e produtos entregues à população. Tais interferências afetam, de forma negativa, o ambiente de negócios brasileiro, comprometendo o desenvolvimento do País e a mitigação da desigualdade social existente.”
Ressalte-se que se aprovada a alteração referida supra, esta terá repercussões indiscutivelmente negativas para a consecução de negócios e para a credibilidade do Brasil perante os demais países desenvolvidos, sobretudo, no que toca ao desalinhamento das Recomendações da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) a qual preza pela (i) extensão dos requisitos e vedações para todos os comitês do conselho de administração e para o conselho fiscal, (ii) a concessão efetiva ao conselho de administração do poder de indicar e demitir o diretor-presidente das estatais, e (iii) o aperfeiçoamento das regras e procedimentos de indicação e nomeação de administradores dessas empresas.
Por sua vez, o Partido Comunista do Brasil (PCdoB) ajuizou, no Supremo Tribunal Federal (STF), a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7331, com pedido de liminar aos referidos dispositivos legais, visto que “as regras esvaziam o exercício de direitos constitucionais à isonomia, à liberdade de expressão e à autonomia partidária” e “afastam da administração das estatais profissionais com habilidades e experiências necessárias para implementar as finalidades públicas dessas empresas”.
Como se não pudesse piorar, ademais de reduzir de 3 anos para 30 dias o período de “quarentena” dos indivíduos indicados às Diretorias das mencionadas estatais, o referido Projeto de Lei prevê, ainda, aumento de limite de despesas com publicidade de 0,5% a 2% da receita bruta anual das estatais. Observe-se que, no caso da Petrobrás, por exemplo, isso significa um aumento de R$8,5 bilhões os quais deverão, como sempre, ser pagos pelos contribuintes que já trabalham mais de 4 meses para terem como sócio (somente nos bônus e não nos ônus) o Governo.
Por todo o exposto, fácil constatar o tamanho retrocesso decorrente do Projeto de Lei 2896/2022 se este for sancionado. Só nos resta lamentar pela impossibilidade de ingresso do Brasil na OCDE (o Clube dos Ricos) e pelos iminentes casos de conflitos de interesse, de benefício particular, de corrupção/propina/vantagem indevida as quais estarão cada vez mais presentes no dia a dia das estatais as quais deveriam servir aos cidadãos e contribuintes e não ao contrário.