02/09/2022 às 15h08min - Atualizada em 02/09/2022 às 15h08min

Holding familiar: Uma análise sob o aspecto do Planejamento Patrimonial

Igor Fonseca de Moraes
Manter-se inserido no mercado privado não se presume tarefa fácil. Dentro desse cenário, algumas empresas despontam, com uma particularidade: são geridas por um grupo familiar. Acredita-se que tal fato se deve ao amplo lastro de valores, gerados no seio da família, que acabam enraizados nas estruturas da atividade econômica.

Por outro lado, se pode imaginar que uma empresa familiar detém características indesejáveis, ou pelo menos estranhas ao meio empresarial, como a emotividade com relação ao negócio ou a maior propensão a conflitos internos mais acalorados e intimistas.

A realidade é que não se mostra possível a afirmação de que empresas familiares são melhores ou piores do que empresas não familiares. Veem-se exemplos de empresas familiares grandiosas e perenes, assim como empresas não familiares com as mesmas características, e vice-versa. O que realmente importa é a qualidade da gestão nos negócios, o planejamento empresarial, a compreensão da dinâmica da atividade empresária que se visa exercer.

No entanto, se faz imperioso reconhecer que as empresas familiares detêm desafios próprios, que precisam ser analisados, estudados e compreendidos, para que não se tornem maiores que o objeto social destas.

Diversos institutos encontram-se disponíveis para a incrementação da atividade empresarial dessas corporações. O que desponta nos dias atuais trata-se do objeto de estudo deste artigo: a holding.

Pretende-se apresentar os conceitos primordiais para a compreensão deste instituto, perpassando pela sua contextualização no que diz respeito às empresas familiares. Assim, o enfoque principal recai sobre a análise das diversas possibilidades e caminhos para a constituição de uma holding familiar, bem como sobre as pretensas vantagens em sua constituição.

Planejamento patrimonial e familiar
 
Nenhum patrimônio na vida é conquistado sem o mínimo de esforço e, mesmo que assim o seja (por meio de herança ou loteria, por exemplo), é necessário substancial empenho para a manutenção do legado. O sucesso de uma empresa raramente resulta de eventos aleatórios. Nos cases de sucesso, sempre há um planejamento minucioso acerca da estrutura organizacional da empresa. Nas empresas familiares, a necessidade de se planejar o arranjo societário se torna ainda mais latente, ante o caráter íntimo das relações entre os sócios e os possíveis problemas que daí podem surgir.

A constituição de uma holding familiar abarca diversos aspectos vantajosos, principalmente, quando o controle de várias empresas está sob o guarda-chuva da mesma família. Estes aspectos serão tratados adiante como vantagens, porém, é de ressaltar que em determinados casos, a constituição de um holding pode não figurar como a melhor opção, ao passo que a sua criação deve ser precedida de uma análise detalhada das operações e estruturação de cada família e de cada empresa.

Dito isto, alguns proveitos que uma holding pode propiciar são: unidade de administração, contenção de conflitos familiares, distribuição de funções, administração profissional, proteção contra terceiros e até mesmo contra fracassos amorosos.

Este corpo de benefícios é comumente alcunhado de blindagem patrimonial, termo este que não parece correto, uma vez que não existe uma fórmula mágica para efetivamente blindar o patrimônio de alguém, pelo menos de forma lícita. Este sempre poderá ser alcançado diante de credores mais enérgicos. O que pode ser feito, é alongar o caminho processual para que se chegue a determinados bens, o que confere o tempo necessário para que o gestor resolva o conflito externo ou programe-se para eventuais baixas financeiras.

Quando uma mesma família detém participação societária dominante em mais de uma empresa, é recomendável que haja a centralização da administração das diversas sociedades e de suas unidades de produção. Aqui, a holding funciona como uma espécie de quartel general, deixando de ser somente uma depositária das participações societárias da família, assumindo um papel de gestão e direcionamento das outras empresas. 

Ressalte-se que isso não quer dizer que as empresas abarcadas pela holding perderão autonomia para o desenvolvimento de sua atividade, mas que a holding, enquanto núcleo de liderança, editará o benchmarking  a ser seguido pelas demais, estabelecerá a cultura e as diretrizes gerais a serem seguidas, o que no âmbito empresarial é de extremo bom tom.

A holding, nesta perspectiva, se torna um centro de ações voltadas para oferecer diretivas e processos funcionais que melhorem o desempenho dos atores produtivos de cada empresa sob seu comando.

Por outro lado, a unidade de administração pode se desdobrar em uma unidade de representação externa. Nos dias atuais é comum que informações desencontradas ou até inverídicas sejam veiculadas por meio da rede mundial de computadores, o que gera impactos econômicos diretos nas empresas. A holding, nesse contexto, pode representar a unidade de discurso nas relações com o mercado e com a sociedade, representando ainda, a própria família e seus membros no que diz respeito a essas relações. Assim, a holding fala por todos, centralizando o discurso externo das empresas e protegendo-as contra eventual incompatibilidade de opiniões entre os familiares. 

Para além disso, a elaboração de uma holding familiar pode prevenir e reduzir conflitos familiares, que comumente levam empresas robustas a derrocadas severas. 

A administração de um negócio familiar, geralmente, se dá pela figura do patriarca ou matriarca delegando funções e gerindo a empresa, ao passo que concentra a atividade direcional para si. Com o falecimento desta figura, não raro a família entra em conflitos de poder, conflitos inúteis, que levam a busca de uma vitória inócua, onde todos perdem. 

Se regido unicamente pelo direito de família, o processo sucessório torna-se tortuoso, caro e demorado, como explana-se mais adiante. Diante de um processo de inventário todos encontram-se em pé de igualdade, livres para destilar suas emoções mais turvas. Na medida em que se cria uma sociedade de participação (holding) e atribui-se o controle das empresas a esta, há uma transmutação da natureza jurídica das relações familiares (pelo menos quanto à ingerência sobre as empresas), que não mais estão regidas pelo direito de família, mas sim pelo direito societário, onde há regras específicas sobre a boa convivência entre os sócios.

Um exemplo que aqui pode ser utilizado, trata-se da “necessidade de se respeitar a affectio societatis, ou seja, a obrigação de atuar a bem da sociedade, de seu sucesso, convivendo em harmonia com os demais sócios”.

Mais do que isso, o estatuto ou contrato social (a depender do tipo societário escolhido), pode veicular cláusulas e obrigações a fim de resolver este tipo de conflito, ou até mesmo determinar regras de convivências entre os sócios. Uma vez que estas cláusulas sejam inobservadas, o sócio terá instrumentos jurídicos para fazer valer a saúde e harmonia na empresa.

Note-se ainda que, ao criar uma holding, erige-se uma verdadeira instância societária, onde os conflitos ficam subsumidos a ela. Diante de um conflito entre os familiares, a decisão tomada será a decisão da holding e não de um ou mais sócios específicos. Isso se mostra importante em um cenário onde existem outros sócios, fora da família. 

A forma societária da holding pode representar, também, solução de alta eficiência e valor para aqueles que pretendem proteger seus bens em relação a interferências externas. Neste sentido, existe a possibilidade de incluir no contrato social da holding algumas regras especiais: cláusula de incomunicabilidade (para impedir a entrada dos bens no patrimônio comum do casal, independente do regime de comunhão de bens adotado), cláusula de impenhorabilidade (para restringir a penhora dos bens gravados) e cláusula de inalienabilidade (para assegurar o patrimônio no seio familiar, impedindo a sua alienação).

De outro lado, a concentração dos bens e participações societárias de uma família em uma holding, gera enorme simplificação da sucessão patrimonial. Os processos judiciais de inventário são, com muita frequência, bastante morosos e delicados, bem como marcados pela carga emocional envolvida no seio familiar (além da afetação pela perda de uma pessoa, acirram-se os ânimos pela divisão do patrimônio). 

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